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Entre o Frio da Sala e o Calor das Eleições

  • Foto do escritor: Rugério Vaz
    Rugério Vaz
  • 5 de nov. de 2024
  • 2 min de leitura

Começo a escrever às 11:56 da manhã, numa sala apertada, típica de um setor comercial do varejo. O ar-condicionado sopra um frio que parece invadir minha pele e se misturar à sensação de insegurança e de estar perdido num emaranhado de informações. Hoje é dia de eleições presidenciais nos Estados Unidos. De um lado, Trump — um projeto de autoritário; do outro, Kamala Harris — uma mulher negra, sem grandes bandeiras, sustentada pelas mesmas ideias vigentes. Olho para a TV, os noticiários explodem com opiniões que me parecem um tanto superficiais. Penso em como tudo parece uma idiotice, mas sei que o resultado dessas eleições vai afetar nossas vidas, querendo ou não. O Brasil ainda é tão dependente dos EUA, e as escolhas de hoje moldarão nossas realidades amanhã.


Lá fora faz 21ºC, mas um arrepio frio percorre meu corpo. Não sei se é o clima ou o ar seco aqui dentro. O céu está fechado, como o meu humor, mas, ao contrário do céu, eu não posso me fechar. Tento driblar o sono no meio do expediente. Coloco a mão no rosto, numa tentativa de despertar, sugando um pouco de lucidez. Olho para cima, sem parar de digitar, e respiro fundo. Este momento, este pequeno retrato do instante, faz parte de algo maior.


Fecho os olhos por um segundo, tentando entender o que se passa com meus sentimentos, minha sensibilidade. São fragmentos confusos, como montanhas e picos que surgem na memória sem aviso, sem permissão. Estou cansado, com aquele peso que chega logo depois do almoço, mas insisto em descrever o que sinto. Este eu, vivo, faz parte de um coletivo, mas, ao mesmo tempo, se sente deslocado. Meus olhos começam a fechar, sem que eu permita.


De volta à sala, volto a olhar as pessoas ao meu redor, tentando afastar essa sensação de fragilidade. Não há espaço para descanso, para fraquejar. Eles parecem hostis, e sinto que não posso confiar.


A verdade, nua e crua, é que me sinto sozinho. E, no fundo, estou sem alguém em quem realmente confiar. No fundo, essa solidão que sinto aqui, nessa sala fria, parece ecoar o distanciamento que percebo no cenário global. A eleição que acontece lá fora, nos Estados Unidos, é mais um lembrete de como as decisões distantes reverberam em nossas vidas, mesmo quando nos parecem desconectadas ou irrelevantes. Trump ou Kamala, é como se ambos fossem parte de um ciclo que segue, independente de quem esteja no poder. Assim como eu me sinto pequeno e vulnerável aqui, somos também, de certo modo, espectadores de um jogo maior, com regras e interesses que nem sempre conseguimos alcançar.


O destino do nosso cotidiano depende de escolhas que fogem ao nosso controle, e, paradoxalmente, também se reflete nessas eleições, onde o poder, assim como essa sensação de solidão, parece sempre estar em outras mãos. Lá, eles decidem, mas aqui sentimos o impacto – e talvez essa distância, essa impossibilidade de confiar plenamente em alguém ou em algo maior, seja um dos motivos para essa estranha insegurança que me acompanha.


E assim, neste espaço apertado e frio, vou continuando, tentando encontrar um fio de sentido, um lugar seguro para o qual possa me voltar, enquanto o mundo, tão distante e ao mesmo tempo tão próximo, segue seu curso incerto.



 
 
 

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